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autores:ricoeur:ricoeur-1990-369-380-a-alteridade-de-outro

Ricoeur (1990:369-380) – a alteridade de outro

Data: 2025-10-30 06:42

Soi-même comme un autre

Vers quelle ontologie?

* A segunda significação que reveste a meta-categoria de alteridade – a alteridade de outrem – e sua estreita conexão às modalidades de passividade

  • A modalidade de passividade que a hermenêutica fenomenológica do si mesmo tem cruzado ao longo dos estudos precedentes quanto ao referir-se do si ao outro que si
    • A nova dialética do Mesmo e do Outro suscitada por esta hermenêutica que atesta que o Outro não é somente a contrapartida do Mesmo, mas pertence à constituição íntima do seu sentido
      • As maneiras múltiplas em que o outro que si afeta a compreensão de si por si no plano propriamente fenomenológico
        • A marcação da diferença entre o ego que se põe e o si que só se reconhece através destas afeções mesmas, que afetam a compreensão de si por si

* A presença da passividade específica do si afetado pelo outro que si em todas as análises

  • O plano linguístico e a interlocução
    • A designação por si do locutor aparecendo entranhada à interlocução, em virtude da qual cada locutor é afetado pela palavra que lhe é endereçada, para empregar um termo familiar do vocabulário husserliano
    • A escuta da palavra recebida fazendo parte integrante do discurso enquanto ele mesmo é endereçado a…
  • O plano da ação e a autodeterminação do agente
    • A autodeterminação do agente da ação aparecendo inseparável da designação por um outro, que me designa ao acusativo como o autor de minhas ações, na segunda fase do trabalho
    • O entranhamento da retomada reflexiva deste ser-afetado pela designação pronunciada por outrem à designação íntima da ação a si mesmo, neste intercâmbio entre designação à segunda pessoa e autodeterminação
    • A expressão deste entranhamento no plano gramatical pelo caráter onipessoal do si que circula entre todos os pronomes
    • A afeção do si pelo outro que si como o suporte deste intercâmbio regrado entre as pessoas gramaticais
  • O plano narrativo e a assunção dos papéis pelo leitor
    • O mesmo intercâmbio entre o si afetado e o outro afetante regendo no plano narrativo a assunção pelo leitor do relato dos papéis exercidos por personagens o mais frequentemente construídos em terceira pessoa, na medida em que são postos em intriga ao mesmo tempo que a ação narrada
    • A leitura constituindo um lugar e um elo privilegiados de afeção do sujeito lendo, enquanto meio onde se opera a transferência do mundo do relato – e, portanto, também do mundo dos personagens literários – ao mundo do leitor
      • A catarse do leitor só se operando se procede de uma aisthesis prévia, que o confronto do leitor com o texto transforma em poiesis, segundo a estética da recepção de H. R. Jauss, retomando livremente algumas categorias
    • A afeção do si pelo outro que si encontrando na ficção um meio privilegiado para experiências de pensamento que as relações reais de interlocução e de interação não saberiam ofuscar
    • A contribuição da recepção das obras de ficção à constituição imaginária e simbólica dos intercâmbios efetivos de palavra e de ação
    • A incorporação do ser-afetado no modo fictício ao ser-afetado do si no modo real
  • O plano ético e moral: a afeção de si pelo outro
    • A afeção de si pelo outro revestindo os traços específicos que concernem tanto o plano propriamente ético quanto o plano moral marcado pela obrigação, finalmente no plano ético
    • A concepção da definição mesma da ética – bem viver com e para outrem em instituições justas – não se concebendo sem a afeção do projeto de bem-viver pela solicitude ao mesmo tempo exercida e recebida
    • A dialética da estima de si e da amizade podendo ser inteiramente reescrita nos termos de uma dialética da ação e da afeção, antes mesmo de toda consideração levando sobre a justiça dos intercâmbios
      • O ser amigo de si – segundo a philautia aristotélica – requerendo já ter entrado em uma relação de amizade com outrem, como se a amizade para consigo mesmo fosse uma auto-afeção rigorosamente correlativa da afeção por e para o amigo outro
      • A amizade fazendo o leito da justiça, enquanto virtude para outrem, segundo outro dito de Aristóteles
    • O passo da ética à moral – do optativo do bem-viver ao imperativo da obrigação – operado, no estudo seguinte, sob o signo da Regra de Ouro
      • O mérito da Regra de Ouro de fazer intervir o comando na juntura mesma da relação assimétrica entre o fazer e o sofrer: o bem que quererias que te fosse feito, o mal que odiarias que te fosse feito
      • O agir e o padecer parecendo assim ser distribuídos entre dois protagonistas diferentes: o agente e o paciente, este último aparecendo como a vítima potencial do primeiro
      • O agente sendo o paciente do outro, em virtude da reversibilidade dos papéis
      • O paciente sendo investido da responsabilidade de uma ação de entrada colocada sob a regra de reciprocidade, que a regra de justiça transformará em regra de igualdade, enquanto afetado pelo poder-sobre ele exercido pelo outro
      • A cumulação em cada protagonista dos papéis de agente e de paciente fazendo com que o formalismo do imperativo categórico requeira a matéria de uma pluralidade de agentes afetados cada um por uma violência reciprocamente exercida

* A questão da nova figura da alteridade e da dialética do Mesmo e do Outro

  • A figura nova da alteridade convocada por esta afeção do ipse pelo outro que si
  • A dialética do Mesmo e do Outro que responde ao requisito de uma fenomenologia do si afetado pelo outro que si
  • A impossibilidade de construir de forma unilateral esta dialética, quer se tente com Husserl de derivar o alter ego do ego, quer se reserve com E. Levinas ao Outro a iniciativa exclusiva da designação do si à responsabilidade
  • A concepção cruzada da alteridade que resta a conceber, que renda justiça alternadamente ao primado da estima de si e ao da convocação pelo outro à justiça
  • O desafio de uma formulação da alteridade que seja homogênea à distinção fundamental entre duas ideias do Mesmo, o Mesmo como idem, e o Mesmo como ipse, distinção sobre a qual se tem fundado toda a filosofia da ipseidade

* A Fenomenologia do Alter Ego segundo Edmund Husserl

  • O exame da quinta Meditação Cartesiana e a redução à esfera do próprio
    • A recusa de retomar o exame da quinta Meditação Cartesiana, ao ponto onde a deixamos com a redução à esfera do próprio, sem nos termos, ao de antemão, inquietado de saber se a redução ao próprio se deixa pensar não dialeticamente, isto é, sem a interferência simultânea do estrangeiro
    • O saber comum e a suspensão filosófica, ou o ego meditante começando por suspender, tornando inteiramente problemático, tudo o que a experiência ordinária deve a outrem
    • O objetivo de discernir o que, nesta experiência reduzida à esfera do próprio, requer a posição de outrem como posição também apodítica quanto a sua, na Meditação Cartesiana
    • O movimento de pensamento todo a feito comparável ao dúvida hiperbólico de Descartes, salvo que não se apoia na hipótese de nenhum gênio maligno
    • O movimento consistindo em um ato filosófico da família dos atos fundadores, estrangeiro a toda suspeição quotidiana
    • A epochè praticada aqui por Husserl, no interior da epochè geral que inaugura a fenomenologia, suposta deixar um resto que nada deve a outrem, a saber, a esfera do próprio, à qual concerne a ontologia da carne
    • A esfera do próprio inteiramente tributária, quanto ao seu sentido, do golpe de força da redução na redução
    • A única via que resta aberta de constituir o sentido outrem em (in) e a partir (aus) do sentido eu
  • O fracasso da constituição de outrem e a descoberta
    • O fracasso da constituição de outrem, enquanto constituição concernente à ambição de fundação característica de uma fenomenologia transcendental de caráter ultimamente egológico, tendo sido a ocasião de uma autêntica descoberta
    • A descoberta paralela e coordenada à diferença entre carne e corpo, a saber, a do caráter paradoxal do modo de doação de outrem
    • As intencionalidades que visam outrem enquanto estrangeiro, isto é, outro que eu, excedendo a esfera do próprio na qual, no entanto, se enraízam
    • O nome de apresentação dado por Husserl a esta doação, para dizer que, à diferença da representação por signo ou por imagem, a doação de outrem é uma autêntica doação
    • A doação de outrem, à diferença da doação originária, imediata, da carne a si mesma, não permitindo viver os vividos de outrem, e, neste sentido, nunca sendo conversível em apresentação originária
    • O afastamento que não pode ser preenchido entre a apresentação de meu vivido e a apresentação de teu vivido
  • O traço positivo e a verdadeira descoberta: a transferência aperceptiva
    • A apresentação consistindo em uma “transferência aperceptiva provinda de minha carne” (Meditações cartesianas, § 50), mais precisamente em uma “apreensão analogizante” que tem por sede o corpo de outrem percebido lá-longe
    • O pareamento (Paarung) como a apreensão do corpo lá-longe como carne, ou a formação em casal de uma carne com a outra
    • A necessidade de um ego encarnado, isto é, um ego que é seu próprio corpo, para fazer casal com a carne de um outro ego
    • A apresentação combinando de forma única similitude e dissimetria
    • A transgressão do programa mesmo da fenomenologia pela transferência analógica que aponta Husserl, em sua dimensão gnoseológica, na medida em que transgride a experiência da carne própria
    • A transferência de sentido não criando a alteridade, sempre pressuposta, mas conferindo-lhe uma significação específica, a saber, a admissão que o outro não é condenado a permanecer um estrangeiro, mas pode se tornar meu semelhante, a saber, alguém que, como eu, diz “eu”
    • A semelhança fundada sobre o pareamento de carne a carne vindo reduzir uma distância, preencher um afastamento, lá mesmo onde cria uma dissimetria
    • A transferência de sentido podendo revestir a forma de uma citação, em virtude da qual “ele pensa”, “ela pensa” significa: “ele/ela diz em seu coração: eu penso”

* A Filosofia da Alteridade Radical segundo Emmanuel Levinas

  • O recruzamento do movimento analógico de mim a outrem com o movimento inverso de outrem a mim
  • O movimento de outrem para mim incansavelmente esboçado pela obra de E. Levinas
  • A ruptura na obra de E. Levinas, dirigida contra uma concepção da identidade do Mesmo, à qual é polarmente oposta a alteridade do Outro, a um plano de radicalidade onde a distinção entre idem e ipse não pode ser tomada em conta
  • A filosofia de E. Levinas se articulando em um plano onde a identidade do Mesmo tem parte ligada com uma ontologia da totalidade, não assumida nem encontrada pela investigação anterior
  • A identidade do Mesmo significando totalização e separação, o si, não distinguido do eu, não sendo tomado no sentido de designação por si de um sujeito de discurso, de ação, de relato, de engajamento ético
  • A pretensão que habita o eu, mais radical que a que anima a ambição fichteana, depois husserliana, de constituição universal e de autofundação radical
  • A pretensão exprimindo uma vontade de fechamento, mais exatamente um estado de separação, que faz com que a alteridade deverá se igualar à exterioridade radical
  • A crítica à fenomenologia e à intencionalidade de Husserl, que concernem a uma filosofia da representação, que, segundo Levinas, só pode ser idealista e solipsista
  • A representação assimilando algo a si, incluindo-o em si, e, portanto, negando-lhe a alteridade, não escapando a este reino a transferência analógica
  • A testificação do outro se dando sob um regime de pensamento não gnoseológico: fundamentalmente o regime da ética
  • O rosto de outrem se elevando face a mim, acima de mim, não sendo um aparecer que eu possa incluir na cerca de minhas representações minhas
  • O rosto não sendo um espetáculo, mas “uma voz” que me diz: “Tu não matarás”, com cada rosto sendo um Sinai que interdita o assassinato
  • O movimento partido do outro acabando sua trajetória em mim, constituindo-me responsável, isto é, capaz de responder
  • A palavra do outro se colocando na origem da palavra pela qual eu me imputo a mim mesmo a origem de meus atos, inscrevendo a auto-imputação em uma estrutura dialogal assimétrica cuja origem é exterior a mim
  • O efeito de ruptura atado a esta filosofia da alteridade ab-soluta procedendo de um uso da hipérbole, digno do dúvida hiperbólico cartesiano
  • A hipérbole aparecendo como a prática sistemática do excesso na argumentação filosófica e como a estratégia apropriada à produção do efeito de ruptura atado à ideia de exterioridade no sentido de alteridade absoluta
  • A hipérbole atingindo simultaneamente os dois polos do Mesmo e do Outro, pondo Totalidade e Infinito um eu entregue à vontade de fazer círculo consigo mesmo, de se identificar
  • O eu de antes da fração do eu pelo outro sendo um eu obstinadamente fechado, trancado, separado
  • O tema da separação, nutrido de fenomenologia do egotismo, marcado pelo selo da hipérbole, se exprimindo na declaração: “na separação o eu ignora Outrem” (Totalidade e Infinito, p. 34)
  • A hipérbole da epifania do lado do Outro, respondendo à hipérbole da separação, do lado do Mesmo
  • O aparecer do rosto se subtraindo à visão das formas e mesmo à escuta sensível das vozes, porque o Outro, segundo Totalidade e Infinito, não é um interlocutor qualquer, mas uma figura paradigmática do tipo de um mestre de justiça
  • A asserção hiperbólica de que a palavra é “sempre ensinante” (ibid., p. 70), e a instrução do rosto não despertando nenhuma reminiscência, à diferença da maiêutica do Menon de Platão
  • O eu sendo alcançado pela injunção e tornado capaz de responder ao acusativo, em que a iniciativa cabendo integralmente ao Outro, o eu responde ao acusativo ainda: “Eis-me aqui!”
  • A hipérbole culminando na afirmação de que a instrução pelo rosto não restaura nenhum primado da relação sobre os termos, não atenuando a inteira dissimetria entre o Mesmo e o Outro
  • Além de ser ou além da essência sobrepujando a hipérbole até lhe dar um tom paroxístico, através de um trabalho preparatório de demolição consumindo as ruínas da “representação”, do “tema”, do “Dito”, para abrir além do “Dizer” a era do “Desdizer”
  • A designação à responsabilidade adotando o tom da hipérbole, em um registro de excesso ainda não alcançado, enquanto desdizer, subtraindo-se ao linguagem da manifestação
  • A designação à responsabilidade reportada a um passado mais velho que todo passado rememorável, e a injunção concernindo um aquém de todo começo, de toda arche: o desdito da arche se chamando an-arquia
  • A hipérbole alcançando o paroxismo na afirmação de que “sob a acusação de todos, a responsabilidade por todos vai até a substituição. O sujeito é refém” (ibid., p. 142) e a “ipseidade, em sua passividade sem arche da identidade, é refém” (ibid., p. 145)
  • O ponto paroxístico da obra sendo atingido pela expressão da substituição, lançada para prevenir o retorno insidioso da auto-afirmação de alguma “liberdade clandestina e dissimulada”
  • A hipérbole conduzindo à hipótese extrema de que o Outro não é mais o mestre de justiça, mas o ofensor, o qual não requer menos o gesto que perdoa e que expia
  • O abismo cavado entre alteridade e identidade só sendo transposto aqui: “É preciso falar aqui de expiação, como reunindo identidade e alteridade” (ibid., p. 151)
  • A hipérbole da separação, do lado do Mesmo, conduzindo ao impasse a hipérbole da exterioridade, do lado do outro, a menos que se cruze o movimento ético do outro para o si com o movimento gnoseológico do si para o outro
  • O tema da separação tornando impensável a distinção entre si e eu, e a formação de um conceito de ipseidade definido por sua abertura e sua função desvendadora
  • A capacidade de acolhimento, de discriminação e de reconhecimento pressuposta ao si, que resulta de uma estrutura reflexiva, melhor definida por seu poder de retomada sobre objetivações prévias que por uma separação inicial
  • A questão da capacidade de discernimento e de reconhecimento do si, tendo em conta que a alteridade do Outro não se deixa resumir na figura do mestre que ensina, mas deve levar em conta a do ofensor e a do algoz
  • O questionamento se a voz do Outro que me diz: “Tu não matarás”, não deve ser feita minha, ao ponto de se tornar minha convicção, que iguala o acusativo do: “Eis-me aqui!” com o nominativo do: “Aqui eu me detenho”
  • A necessidade da linguagem, com seus recursos de comunicação e de reciprocidade, atestada pelo intercâmbio dos pronomes pessoais e pelo intercâmbio mais radical da pergunta e da resposta, para mediatizar a abertura do Mesmo sobre o Outro e a interiorização da voz do Outro no Mesmo
  • A necessidade de uma dialógica superpor a relação à distância pretensamente absoluta entre o eu separado e o Outro ensinante

* A Dialética Cruzada do Si Mesmo e do Outro que Si

  • A sugestão, resultante desta confrontação entre E. Husserl e E. Levinas, de que não há contradição alguma a ter por dialeticamente complementares o movimento do Mesmo para o Outro e o do Outro para o Mesmo
  • Os dois movimentos não se anulando na medida em que um se desenrola na dimensão gnoseológica do sentido, e o outro se desdobra na dimensão, ética, da injunção
  • A designação à responsabilidade, segundo a segunda dimensão, remetendo ao poder de autodeterminação, transferido, segundo a primeira dimensão, a toda terceira pessoa suposta capaz de dizer “eu”
  • A antecipação desta dialética cruzada do si mesmo e do outro que si na análise da promessa
  • A capacidade de manter a palavra, de se manter, dependendo de um outro contar comigo, sendo a condição da capacidade de manter a palavra e de se manter.

PS: RICOEUR, Paul. Soi-même comme un autre. Paris: Editions du Seuil, 1990

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