====== Fink (1994:129-145) – mundo e história ====== //Data: 2025-10-27 21:00// ==== Proximité et distance ==== === Monde et Histoire === * I. A problematização da relação entre os termos "mundo" e "história" e a necessidade de superar as discussões metodológicas tradicionais para formular a questão simples, porém não ingênua, sobre a essência do histórico. * A indeterminação conceitual do termo "o histórico" e a recusa de uma definição precipitada, abrindo espaço para uma investigação fenomenológica. * O questionamento sobre o que constitui o modelo para a pergunta pelo "histórico", interrogando se se trata de uma coisa, uma substância, um movimento, um caráter de ser, um comportamento ou um "relacionamento". * A tese central de que, enquanto o histórico for compreendido apenas como movimento de um ente, o relacionamento com o mundo do [Dasein->/spip.php?page=search_definitions&search=Dasein] humano permanece impensado e incompreendido. * A análise da situação de vida na qual sempre já nos encontramos, caracterizada por uma compreensão aproximativa e equívoca da história como um fenômeno conhecido e no qual vivemos. * A crítica ao conceito massivo de história como evento, que subsume a história humana a uma história natural mais geral e englobante, seguindo a concepção de Nietzsche do homem como o instante mais orgulhoso e mentiroso na história do mundo. * A delimitação do propriamente histórico como restrito ao homem, em oposição aos processos na natureza mineral, vegetal e animal, mesmo reconhecendo a inserção do homem na história natural através de sua corporeidade e estrutura biológica. * A caracterização do homem como o ser mais temporal, que sabe de seu caráter passageiro e se relaciona com o tempo, sendo, portanto, histórico em um sentido mais rigoroso que qualquer outro ser vivo. * A problematização de como o homem é histórico, rejeitando a noção de que a historicidade seja uma propriedade substancial e propondo que o homem é um ente que se relaciona consigo mesmo ao se compreender. * A investigação sobre a estrutura do homem como "em si para si" e a questão de saber se esta constitui sua "natureza imutável" ou a dimensão daquilo que é mutável nele. * A exploração das múltiplas dimensões da historicidade humana: a história do saber empírico e a priori, a história da estimação e da posição de valores, a história como ser político, a história da técnica e do fazer criador, e a história religiosa. * A utilização do termo coletivo "cultura" para reunir as diferentes dimensões históricas, caracterizando o homem como criador de cultura, em distinção ao animal e a Deus. * A interrogação sobre a compreensão do fenômeno da "cultura", sua maneira de ser e a relação problemática entre a parte animal-natural e a parte criadora de cultura no ser humano. * O questionamento sobre qual é a história fundamental que determina o curso temporal do gênero humano, mencionando a disputa entre a história das "ideias" e a dos "processos econômicos". * A descrição do aprofundamento filosófico desta disputa através do pensamento especulativo, que concebe o homem como o lugar onde aparece o movimento do "fundamento absoluto", atribuindo à história humana uma significação mundial representativa. * A extensão especulativa do conceito antropológico de história ao cósmico, onde o homem se torna um "deus oculto" que realiza sua "consciência de si" na filosofia especulativa. * A contraposição da crítica "materialista" à unio philosophica idealista, acusando-a de ser uma grande ilusão que se alienou do fundamento real econômico do Dasein. * A análise de que a disputa entre a especulação idealista e a crítica materialista é portadora de motivos essenciais, mas ambas falham em compreender adequadamente a finitude humana. * A conclusão de que a finitude humana é mal compreendida tanto quando é explicitada como um limite aparente do absoluto, quanto quando é apreendida como uma limitação autárquica sem relação com o infinito. * A tese final de que o homem é a mais finita das criaturas finitas porque se sabe finito e se relaciona simultaneamente com o infinito da totalidade do mundo, sendo que o "histórico" inerente a ele comporta um difícil relacionamento cósmico. * II. A análise da concepção de história na fenomenologia de Husserl, particularmente em "A Crise das Ciências Europeias e a Fenomenologia Transcendental". * A identificação do pensamento fundamental de Husserl de que a vida constituinte da subjetividade transcendental é em si mesma histórica, uma história da vida absoluta. * A primazia da história do saber como a história fundamental em Husserl, fundada na compreensão do saber como "constituição", como o ser próprio do sujeito absoluto. * A interpretação da "crise" como a virada da apreensão ingênua do saber para a apreensão transcendental, descrita como uma peripécia em um drama histórico mundial. * A descrição husserliana do despertar do espírito moderno com a radicalização da racionalidade no projeto de uma teleologia de fins racionais infinitos, concebida matematicamente. * A análise da dependência genealógica da apreensão do mundo científico em relação ao mundo da vida, uma prefiguração do motivo transcendental. * A justificativa de Husserl para focar a história do saber científico, devido à sua auto-compreensão como acesso originário ao ser verdadeiro das coisas e por ter se perdido no extremo afastamento do fundo subjetivo da vida. * A interpretação de Descartes como uma figura de Janus que impulsiona o "objetivismo" matemático, mas também antecipa a redução fenomenológica. * A caracterização específica do tournant histórico decisivo da redução fenomenológica, onde o sujeito se compreende como sujeito transcendental, rompendo com a auto-apreensão natural como "homem". * A concepção husserliana do "objetivismo" da ciência moderna como o modelo de uma autoalienação do espírito subjetivo absoluto, que se torna consciente de si na redução. * A teleologia secreta da história da ciência em Husserl, na qual a vida constituinte deve se perder completamente na extraversão objetivista para então se encontrar, num retorno à origem a partir da mais extrema autoalienação. * A crítica à concepção husserliana por não determinar claramente o tempo em que ocorre a virada para a autoconsciência transcendental, questionando se este tempo é "sem mundo". * A consequência, na filosofia de Husserl, de atribuir o tempo ao sujeito, interpretando-o como movimento do espírito subjetivo, como sua "auto-temporalização". * A ligação entre esta ausência de mundo da temporalidade e a dissolução da pensamento do mundo no fenômeno de horizonte, sujeitizando tanto o tempo quanto o mundo. * A problematização da tentativa husserliana de superar a finitude humana através da redução, questionando se a finitude não é pensada de modo demasiado estreito. * A dificuldade crucial do idealismo, partilhada por Husserl, de não conseguir tornar claro o motivo pelo qual o infinito se disfarça sob a máscara da finitude. * O reconhecimento de que Tempo, Mundo e Finitude são problemas não elaborados e não dominados na visão grandiosa de Husserl sobre a história do saber. * A comparação com Hegel, na medida em que Husserl também coloca a impulsão do espírito para a autoconsciência como a força motriz da história, que atinge seu fim absoluto com a realização desta autoconsciência. * A menção aos problemas difíceis ligados à mortalidade dos indivíduos e à mudança de gerações, não dominados na tentativa husserliana de explicar a intersubjetividade. * O reconhecimento positivo da tentativa de Husserl de radicalizar a história da consciência e do saber em uma doutrina da temporalização, visando apreender o relacionamento com o mundo que determina o Dasein humano. * III. A exposição dos problemas históricos na filosofia de Heidegger, em uma dimensão fundamentalmente diferente da de Husserl. * A compreensão do Dasein humano em Heidegger não a partir da relação intencional de um sujeito cognoscente, mas a partir da abertura prévia do homem ao ser. * A tese de que o homem é lançado na abertura do ser, compreendendo o ente como ente na luz do ser, embora este medium de compreensão lhe seja, em certa medida, oculto. * A definição do ser-no-mundo compreensivo e tonalmente disposto como a constituição de fundo do Dasein humano. * A dupla abordagem do problema da história em Heidegger: primeiro, como elucidação ontológica do modo de ser humano como existir histórico; segundo, como a retomada pensante da história da metafísica como história do esquecimento do ser. * A definição do "histórico" não como o saber objetivo de um sujeito, mas como a compreensão, mais ou menos explícita, do ser da objetividade e da subjetividade. * A exposição da historicidade da compreensão do ser através de uma interpretação do ser-no-tempo humano, onde o homem é temporalizante. * A explicitação da temporalização do Dasein em relação com a morte, onde a solidão do indivíduo diante de sua própria morte permite o surgimento da compreensão própria do tempo. * A inclusão essencial, na compreensão do ser, do seu cumprimento como descoberta das coisas e abertura do ser humano próprio, cuja história é uma história da "verdade". * A identificação do ser-no-mundo e do ser-na-verdade como determinações existenciais identicamente originárias. * A caracterização da fase posterior do pensamento heideggeriano pelo reconhecimento de que a clareza da compreensão, a verdade como desvelamento, a "mundanidade" e a temporalização são, antes de tudo, determinações do ser mesmo. * A tese de que, porque o ser mesmo é o temporalizante, o adventivo, o histórico, o homem que lhe é confiado é essencialmente histórico. * A definição do relacionamento do homem com o ser como o problema mais fascinante da filosofia heideggeriana da história, que não é um relacionamento entre dois entes. * A tentativa rigorosa de Heidegger de se ater à finitude do ser humano e, ao mesmo tempo, conservar a abertura ao ser, onde a clareza do ser se destina ao ser mais finito. * A concepção de que, no história do homem, se manifesta a história do ser, a história da verdade, a história do mundo, sem que o homem se torne "absoluto". * A avaliação de que Heidegger evita o risco de "deificar" o ser humano ao posicionar como dimensão do "histórico" a abertura do homem ao ser e a conversão prévia do ser para o homem. * A identificação desta conversão recíproca como a história fundamental pensada especulativamente, na qual outros processos históricos podem se ancorar. * O destaque à interpretação de Heidegger do homem como um ser ecstático, determinado por uma relação a algo que não é um "ente", constituindo o espaço da história. * A primeira problematização do conceito fundamental "o ser" em Heidegger, que corre o risco de se volatilizar em um conceito e de perder seu caráter espácio-temporal mundano. * A proposta de que o espaço-tempo completo do ser seja nomeado como mundo, entendido como o universo, o todo do mundo, e não apenas como um horizonte intencional ou uma auréola de significância. * A questão sobre a identidade ou não entre o relacionamento com o ser e o relacionamento com o mundo, concluindo pela negativa, dado que o conceito heideggeriano de ser é pensado a partir da linguagem. * A análise de que, em Heidegger, o desvelamento tem como fundo essencial o velamento, mas a clareia é o modo como o ser reina, pertencendo o movimento de velamento ao ser como a sombra pertence à luz. * A segunda problematização da abordagem heideggeriana por não considerar a divisão do ser humano em metade masculina e feminina, e por relegar ao fundo os problemas da socialidade e as figuras de fundo sociais dos grupos e povos. * IV. A apresentação de problemas significativos e abertos a partir da conceituação do histórico como abertura ecstática do gênero humano ao mundo. * A interrogação sobre o justo conceito de mundo, questionando se é a soma de todos os entes ou o espaço-tempo compreensivo que engloba todas as coisas finitas. * A problematização do tempo do mundo e do espaço do mundo como totalidade mundana em sua essência englobante-inclusiva, um problema ainda não resolvido. * A questão sobre se o mundo é apenas o reino da singularização e da diferença, ou se a noite do Hades constitui igualmente uma dimensão do mundo. * A tese de que o homem existe historicamente em relação ao princípio mundano da singularização e da diferença no trabalho e no combate, como formas comunitárias fundamentais e figuras sociais do Dasein. * A caracterização do trabalho e do combate como figuras de sentido de uma abertura determinada ao mundo, em distinção ao modo como o animal busca seu alimento e sua presa. * A proposição de que o homem se relaciona com a outra dimensão do mundo, a dimensão sem figura, no amor e no culto dos mortos, onde bebe a certeza de uma unidade e tem o pressentimento de um fundo comum e inalienável. * A definição do amor e da morte como o solo a-histórico da história, enquanto o trabalho e o combate traçam sulcos e constroem reinos sobre este solo. * A abertura, no trabalho e no combate, ao "polemos pater panton" cósmico, e no amor e na memória dos mortos, à paz cósmica. * A descrição das dimensões do mundo não como justapostas, mas imbricadas uma na outra em um incessante movimento de mundo do aparecer, que expõe as coisas finitas no aberto e as recolhe no fundo informe. * A concepção de que é no jogo, e na comunidade festiva da tragédia, que o homem se relaciona de maneira compreensiva com este movimento de mundo da geração e da corrupção de todo ser-finito. * A referência ao sofrimento de Édipo como o ponto culminante da intimidade do Dasein humano com o mundo. * A definição de que a história da humanidade se torna verdadeiramente uma história do mundo quando se situa de maneira compreensiva no interior do jogo do mundo. * A citação de Heráclito, "tudo o que rasteja é conduzido à pastagem pelo chicote", para ilustrar este movimento cósmico. * A conclusão de que a conexão entre mundo e história se mostrou como o problema de um relacionamento notável, centrado na interpretação do relacionamento do homem com o ser e com o mundo. * A indicação da questão única que orientou a exposição fragmentária: se o relacionamento é interpretado como uma identificação ôntica híbrida do homem com o "absoluto" ou como uma abertura ecstática a algo que não é um ente e tampouco um nada vazio. ---- //PS: [FINK, E. Proximité et distance: essais et conférences phénoménologiques. Tr. Jean Kessler. Grenoble: Jérôme Millon, 1994b]//